Interiorização tecnológica
Um estudo divulgado ontem mostra que dois terços das
incubadoras de empresas do Brasil têm foco na área tecnológica, de alto valor
agregado.
E cada vez mais as incubadoras estão se disseminando pelo
interior do País, revertendo uma característica de concentração desses núcleos
de empresas emergentes nas capitais.
Nas 27 unidades da federação, há atualmente 384 incubadoras,
mas houve uma redução no setor desde 2007, quando esse número chegou a 400
incubadoras.
Os dados são do documento "Estudo, Análise e
Proposições sobre as Incubadoras de Empresas no Brasil", lançado pelo
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e pela Associação Nacional
de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec).
Uma reportagem publicada em maio, com base em resultados
prévios do estudo, mostrou que 55% das empresas incubadas inovam para o mercado
nacional, enquanto 28% inovam para o mercado local e 15% disseram produzir
inovações em âmbito mundial.
Brasil conta com 2.640 empresas emergentes em 384
incubadoras
Os dados foram obtidos a partir da revisão de estudos
anteriores e aplicação de questionários em uma amostra de 60 incubadoras, o que
garantiu à pesquisa uma margem de erro de dois a três pontos percentuais, de
acordo com o relatório técnico.
O estudo, coordenado pela economista Maria Alice Lahorgue,
do Departamento de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS), também incluiu a realização entrevistas, em 2011, com 23 gestores
de todas as regiões do País para levantamento e confirmação de dados.
Descentralização das incubadoras
Maria Alice explicou que, como as incubadoras são ligadas
diretamente às universidades, esses núcleos estão seguindo o processo de
interiorização que vem ocorrendo com as instituições de ensino superior.
"Nos próximos dois anos nós teremos uma nova leva de
interiorização com a criação de novos IFs [Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia], que estão sendo instalados basicamente no
interior", afirmou.
Das incubadoras que serviram de amostra para a pesquisa, 45%
estão instaladas em capitais de Estado ou no Distrito Federal e o restante em
cidades do interior, o que demonstra certo equilíbrio na distribuição.
Um estudo anterior feito pela economista, em 2004,
identificou que as incubadoras da capital têm um perfil diferenciado daquelas
do interior; enquanto as primeiras eram mais voltadas para inovações radicais,
as segundas atuavam principalmente com inovações incrementais. O documento que
está sendo lançado agora não se debruça sobre esse ponto, mas a coordenadora
pretende dar continuidade aos estudos a partir dos dados já levantados.
Perfil tecnológico
A tecnologia é o foco principal para 67% das incubadoras,
enquanto apenas 15% desses núcleos de empreendedorismo são voltados para a
economia solidária e 13% deles reúnem empresas que atuam com produtos ou
tecnologias tradicionais.
Entre as 2.640 empresas incubadas no País, a média de
emprego gerado por firma é de 7,28 postos de trabalho. Esse índice sobe para
12,69 empregados para as companhias que atingem a maturidade, as chamadas
empresas graduadas, que já percorreram todas as fases de uma incubada e estão
aptas a enfrentar o mercado com instalações físicas próprias.
Um dos principais objetivos do estudo é traçar um perfil
desses núcleos voltados à inovação, que agregam companhias ou empreendimentos
nascentes para compartilhar infraestrutura, serviços e apoio gerencial e
técnico, além de dividir custos de operação.
Os dados do estudo mostram que metade das incubadoras tem
até oito anos de existência, a maior parte delas com idade entre três e cinco
anos. Outro ponto importante diz respeito às fontes de receitas, que são
oriundas principalmente das entidades gestoras e públicas.
Entre as pesquisadas, 27% não têm receita própria e em
apenas 11% delas a receita própria contribui com mais da metade da receita
total da incubadora.
Financiamento para incubação
Maria Alice Lahorgue aponta a questão da redefinição de
políticas públicas como um dos pontos centrais do debate, pois todo o
financiamento para incubação de empresas, no âmbito governamental, é originado
do MCTI, seja por recursos da própria pasta, seja da Financiadora de Estudos e
Projetos (Finep), seja do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq).
No entanto, alerta a pesquisadora, o conceito de inovação
que permeia a atividade das incubadoras vai além da inovação tecnológica, incluindo
setores tradicionais, agroindústria e economia solidária, entre outros.
Para Maria Alice, o Ministério de Desenvolvimento, Indústria
e Comércio (MDIC) tem tido "uma participação muito marginal" no
processo de financiamento. "Deveria haver uma liberação do MCTI muito mais
voltada para inovação via spin-offs da pesquisa, por exemplo, enquanto o MDIC
poderia fazer o fomento da outra parte", sugere, citando o caso dos
Arranjos Produtivos Locais (APLs), dos setores mais tradicionais e das incubadoras
mistas.
Ela destaca que esses setores menos ligados à ciência e à
tecnologia têm se beneficiado com o fomento do Serviço Brasileiro de Apoio às
Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), mas não de agências governamentais.
"Nós temos uma diversidade muito grande de tipos de incubadoras e de tipos
de negócios incubados, mas o financiamento e a política de fomento não têm uma
visão clara desse fato. O que se procura também com esse estudo é desvendar as
diferenças e colocar sobre a mesa a necessidade justificada de se pensar
políticas que abranjam o conjunto do processo de incubação."
As universidades e os institutos de pesquisa são as
principais entidades a que as incubadoras brasileiras estão vinculadas,
seguidos pelas prefeituras e governos estaduais.
Desempenho das incubadoras
Uma das formas de se mensurar o papel desempenhado por esses
núcleos de empreendimentos emergentes na sociedade é pelos objetivos declarados
pelas próprias incubadoras.
O estudo revela que os objetivos mais citados pela pesquisa
foram: dinamização da economia local; criação de spin-offs; dinamização de
setor específico de atividade; inclusão socioeconômica; e geração de emprego e
renda.
A coordenadora do estudo afirma que durante muitos anos o
setor de incubadoras no Brasil apresentou um vigoroso crescimento anual de dois
dígitos, chegando até a marca de 20%, mas que esse número sofreu uma
desaceleração.
"O sistema de incubação no Brasil atingiu a sua
maturidade. Hoje está muito mais refreado o 'efeito moda', em que ter uma
incubadora dava status, por ser interessante em termos de imagem pública.
Atualmente, com a maturidade, sabe-se que a incubadora tem um fim que é criar
empresas de sucesso. E não é qualquer empresa, é uma que traga benefícios para
a sociedade, e isso impõe alguns dispêndios, que as pessoas começam a perceber
melhor", conclui Maria Alice.
Para ela, pode-se dizer hoje que o setor está estruturado e
conta com padrões claros de qualidade, mas ainda falta definir uma certificação
para as incubadoras, o que prevê ocorrer nos próximos cinco anos.
Fonte: Portal Inovação Tecnológica